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terça-feira, 28 de agosto de 2012

TEMPOS DUROS

 

Na Galiza o tempo é de pedra, o sol é de pedra, a alma é de pedra

O padre, Adolfo se chamava, já morto posso dizer seu nome...
O padre vendera os santos, vendera a pia os altares, vendera a alma...

O padre olhou para o homem do sol lá no campanârio,
assim chamava o pai o relogio de pedra...

O pai olhou para o padre e disse:
Se você leva o homem, se o baixar e o levar, não suba mais à aldeia pois subir subirá, mas descer não desce mais...

O pai falava com orgulho de seu jeito de defender o nosso relógio de sol, o único que temos para medir o tempo pois vivemos num mundo no que outros nos mudam a hora...

O padre acovardou-se e não tocou o homem de pedra, do sol, e das horas, e agora está morto...
Mas, mesmo assim, a cada vez que subo à aldeia olho para a torre da igreja... Porque a minha memória também é de pedra... 

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 28 do 8 de 2012

domingo, 5 de agosto de 2012

JÁ NÃO ESPERO


 


 


JÁ NÃO ESPERO 

Já não espero carta tua
Já me afoguei noutras palavras
a palavra pedra 
a palavra água
recortando um horizonte sem saída
sem barca e nem capitão
e sem tu te importares...

Já não espero carta tua
Já vi tua morada de número arrancado
Já vi meu carteiro devorado pela rua 
Já se perdeu com minhas cartas
comidas antes de tocarem seu destino

Já não espero carta tua
perdi o endereço de teu coração errante
e as minhas mãos já se negaram 
três vezes hoje às palavras 
agora plantam plantinhas no quintal 
escutam a Melra como se mãos ouvissem 
e voam, ahhhh como minhas mãos voam
quando da nossa alma se escondem...

Já não espero carta tua
Já não te escrevo
Já perdi a caneta noutras batalhas
igualmente irreparáveis...
Já minha liberdade me prende noutros nadas
Já não espero carta tua
Já não espero

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 27 do 7 do 2012 

http://www.youtube.com/watch?v=esrTfwBiOM0&feature=player_embedded
 

Só ante o silêncio


LER OUVINDO: http://www.youtube.com/watch?v=esrTfwBiOM0&feature=player_embedded#!

Só ante o silêncio

Ante a invernia do silêncio 
vestí no corpo as cores do dia
vesti os olhos de ausência
e comprovei que tua camisa 
era do tamanho do meu céu

Depois reparei nas palavras
Nas minhas
Nas usadas
Nas tuas
Nas por nós abusadas

No silêncio reparei também
Nas palavras sonhadas
Nas roubadas
Nas desesperadas

E foi no silêncio que escolhi calar
sei que poderia se o permitir
ver crescer em mim infernos 
nos que lembrar palavras 
que nunca foram minhas

Mas no ventre do silêncio decidi
destroçar a arqueologia de todo eco
ouvir apenas os tambores do medo
meu medo que fala alto 
meu medo que se impõe
até apagar esse abismal silêncio

Concha Rousia
Quintal d'Amaia 26 do 7 de 2012
NÂNTIA NO JORNAL La Voz de Galicia de hoje...

Por vez primeira na sua curta história Nântia sai retratada no jornal.... Essa foto minha com ela foi tirada ontem no dia da Galiza, no Festigal... Tudo altamente simbólico, e eu não podia deixar de dividir com todos e todas vós, amigos de Nântia e meus... Com os que me acompanhastes fisicamente, que fostes muitos, e com os que me acompanhastes de outras muitas formas... todas elas eu apreço e guardo com carinho...
Agora minha Nântia, vossa Nântia, nossa Nântia... começou a sua andaina. Obrigada....

Nosso Milho no quintal...

Foto: Acarinhando o MILHO mais especial que a Terra me ofereceu...

Noites e dias

 
Há noites que 
de curtas que são
se fazem longas

e há dias 
em que o sol sai
so pra se negar

Concha Rousia

Ensinamento

 Foto: Ensinamento

Tentei inúmeras vezes ensinar o lume 
para que ele deixe de queimar-me  

Mas a cada vez que me aproximo 
ele me queima da mesma forma
ele me morde e cala se apaga... 

Então finalmente eu aprendi 
que o lume sempre me vai queimar
porque isso é o que o lume faz

Agora tenho que me ensinar a mim isso

Concha Rousia

Quintal d'Amaia 23 do 7 de 2012
(acho que finalmente aprendi)

Ensinamento

Tentei inúmeras vezes ensinar o lume 
para que ele deixe de queimar-me 

Mas a cada vez que me aproximo 
ele me queima da mesma forma
ele me morde e cala se apaga... 

Então finalmente eu aprendi 
que o lume sempre me vai queimar
porque isso é o que o lume faz

Agora tenho que me ensinar a mim isso

Concha Rousia

Quintal d'Amaia 23 do 7 de 2012
(acho que finalmente aprendi)

Pensamentos

Jamais se regressa ao mesmo lugar.... 
jamais se regressa...
CR

Que a luz do dia torne as sombras 
para longe de nossos corações
e para longe de nossas palavras...

CR

 Aceito desafios só se forem impossíveis 
Pois o possível deixou de me desafiar...

Concha Rousia

Sou presa de minha liberdade...
CR 

:)(:

 Foto: Me apagarei 
Mesmo que me custe os olhos
Me apagarei de ti

CR

Me apagarei 
Mesmo que me custe os olhos
Me apagarei de ti

CR

Vem...

Foto: Vem...

Digo vem...
ja nao digo fica

Digo apenas vem
digo olha-te em mim
digo toca minha alma 

E depois se decidires
se escolheres o caminho... parte 
mas antes tens que vir...
pois como partir se não veis primeiro

Vem amor
toca minha alma 
deixa-me ver que existo
que respirar é certo
que sorrir tem sentido
que amar é um verbo real
não uma palavra vazia

Amor vem... 
minha porta está atrancada
c'uma palha de centeio
então entra entra 
e se quiseres ou necessitares
parte logo.... mas agora vem
entra Amor.... vem.... 

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 21 do 7 de 2012  
16:30
Vem...

Digo vem...
ja nao digo fica

Digo apenas vem
digo olha-te em mim
digo toca minha alma 

E depois se decidires
se escolheres o caminho... parte 
mas antes tens que vir...
pois como partir se não veis primeiro

Vem amor
toca minha alma 
deixa-me ver que existo
que respirar é certo
que sorrir tem sentido
que amar é um verbo real
não uma palavra vazia

Amor vem... 
minha porta está atrancada
c'uma palha de centeio
então entra entra 
e se quiseres ou necessitares
parte logo.... mas agora vem
entra Amor.... vem.... 

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 21 do 7 de 2012 
16:30

Amo os 'Talvez'


Amo os 'Talvez'

Sua infinitude
seu desejo concreto
superpõendo-se ao mortal realismo

Amo os talvez
mais do que os própios sim
que podem ser falsos

Amo os talvez 
sempre verdadeiros
portas que o desejo abre 
mesmo que o destino não deixe (talvez) 
entrar o vento no que nossas voar asas

Amo os talvez
é por isso que nunca me despeço
não fecho a porta
junto ela a seu marco
para que sempre possa entrar 
alguém ou ninguém....

Amo os talvez

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 21 do 7 de 2012

Com Nântia...

Onde a alma...


Onde a alma... 

Como será que a alma sangra 
quando é espetada pela faca 
mesmo que a faca seja palavra?

Mesmo que a faca seja falada
como será que a alma sangra?

Será tinta a sair de nosso íntimo... 
Será em poemas que ela sangra? 

Cada letra uma gota de vida
vou-me desfazendo no poema

Como atalhar essa hemorragia?

Será que se pode fazer torniquete?
onde apertar para que isto pare
para que meu ser não se estinhe?

Onde será que está a ferida
E a alma... 
Onde será que a alma está?

Concha Rousia
Quintal d'Amaia 20 do 7 de 2012

O que enche o meu saco...


O que enche o meu saco...
(Das cartas sem destinatário) 

Sentada frente ao mar... 'Esse caminho' como poetizou nosso Celso Emilio. Decidi averiguar que levo no meu saco. Adoro misturar mundos, misturar dentros, misturar foras. O primeiro q
ue vi foi um aviso a me alertar: Olho, menina, deverias estar fazendo outras cousas...!! Ahhhh como eu odeio 'deverias', eles me tratam como se eu fosse criança, mas eu sou esperta desativadora de 'deverias'... Então fiz como que não via e segui entrando no saco, que está carregadinho, pesado, é um saco que comprei no Ceará, no mercado dos artesãos em Fortaleza. Este saco é quase a única coisa que consegui comprar nessa minha derradeira viagem, nem sequer consegui um chip da TIM, mas consegui o saco, ele bateu nos meus olhos dizendo: Sou teu! 20 Reais, preço é importante para as pessoas que teceram o saco e para mim, indígena entre indígenas. 

E agora venho descobrir aqui ante esse imenso olhar azul do Atlântico, que o que mais levo no saco são lembranças, este saco tem as cores dos sacos-do-pão, quando em grão o acadávamos o dia da malha, para que os homens os acarretassem ao lombo para vazar no imenso arcaz... Depois seria também nesses mesmos sacos que iria ao moinho. Vou deixar o moinho fora do meu conto ou não termino aqui hoje... Ahhhh as noites no moinho... Essas nem caberiam em mil tardes de lembranças com esta... 'Vai varrendo', dizia o moinheiro, tu varrias e quando ele dizia: 'de tudo!' Paravas, e a farinha passava a ser a do vizinho... A roda de pedra não pode moer sem grão, nem parar até o final da muinhada*, um grão irmana-se com o outro.... Bom, eu não vi grão quando andei pelo Ceará, mas vi cana, e vi homens com fouces pela beira da estrada, e vi meninos pela beira da estrada... E vi que a estrada não era vista pelos políticos, meu amigo angolano ia colocando as palavras à nossa experiência... É, levo no saco meu amigo Afonso, meu irmão de Angola, levo os meninos da beira da estrada, levo a estada, mas quero ir alem a saudade, ver o que mais eu levo... 

Levo duas agendas, uma deste ano (cor azul) e outra do passado (cor laranja) tenho contas atrasadas, números de amigos, é, eu já não confio no telemóvel..., nunca devi confiar... Levo cartões de professores, de escritores, de músicos, de atores de teatro, de um fotógrafo do Sertão, ao fotógrafo vou escrever, talvez ainda hoje, foi uma alma que reconheci, mesmo sem tempo.... Levo as flores com as que ele me fotografou, as flores de Guaramiranga que são gigantes... Levo um cartão do metro de madrid, às vezes pergunto-me para que guardo certas cousas... Mas eu sou de guardar, levo papelzinhos pregados com palavras passe para wi-fi de hotéis, de restaurantes, de casas de cultura, de bares, etc. de vários continentes...


Levo um poema rascunhado num envelope usado, levo a tampinha do rádio do carro... E agora vou tirar o resto tudo para fora e vou, sinceramente, continuar.... Levo meia dúzia de canetas, dois telemóveis, um controle remoto da garagem do meu consultório, os documentos do meu carro, meu carro cor 'acuamarina'... Levo também uma cheia de chaves, algumas não lembro que portas abrem... Uns óculos escuros para proteger meus olhos do sol, creme dental e uma escova, um penso, vários pendrives, uma pedra triangular, escura, com uma beta alaranjada que a atravessa... Levo poemas impressos de meu último recital, uma livreta com poemas rascunhados que um dia esquecerei... Um trevo secando no meio de uma outra livretinha, junto de uma foto de meus pais, sentados, frente a casa em que nasci.... Um dos telemóveis interrompeu meu mergulho no saco, tenho de ir agora, me esperam, guardo tudo, incluída a máquina de fotos que tinha sobre a mesa, depois meterei o ipad no que ainda escrevo, e junto meterei o mar, com barquinhas e gaivotas incluídas... E já agora, meu bem, vejo que não sei o que fazer contigo, poderia meter-te a ti também, mas para isso teria que tirar tudo pra fora... porque tu hoje, tu sozinho, encherias meu saco... Então, por mais um dia, vou-te levar sob as dobras do meu blusão, amanhã, sim amanhã, eu decido... 


Concha Rousia
Muros 17 de 7 de 2012

(A música é de hoje: 19 do 7 de 2012; não levava no saco o dia 17) http://www.youtube.com/watch?v=-FsWe2sc7m

Muinhada*
s. f. 
(1) Reunião que se faz no moinho enquanto se aguarda pola moedura.

Oramar:

 Foto: Oramar: 

Quero amar-te
quero amar-te a ti
amar-te tanto assim 
que renuncio a ter-te
pela mesma razão 
pela que desejo ter-te
quero amar-te

CR

Oramar: 

Quero amar-te
quero amar-te a ti
amar-te tanto assim 
que renuncio a ter-te
pela mesma razão 
pela que desejo ter-te
quero amar-te

CR

O dia que o mar me pintou de Azul....

 

E ali na beira do mar estavam elas...
Tão diferentes, tão iguais... 
E nós éramos flores noutro sonho... 
Amei a tarde em que o mar me pintou...

CR

Talvez uma despedida



Toda hora é hora de partir, meu bem
então queria deixar alguma cousa para ti 
mas nada tenho já de valor para dar... 

O caminho vai ficando com meus pés
o vento já ficou com minhas asas
o vizinho fica sempre com meu sorriso
e a alva rouba todo dia minha atenção

Nada mais posseio de valor 

Eu já tive cor no meu rosto 
não tenho mais...
já tive esperança no olhar
tive a chave da felicidade na mão
e os segredos do mundo no ouvido 
mas tudo, como faço contigo, 
tudo eu deixei partir de mim...

Guardo apenas meu adeus para dar 
e alimentar por um dia tua liberdade
Então deixo que faças tua escolha
mas terá de ser 'adeus' ou 'nada' 

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 17 do 7 de 2012
http://www.youtube.com/watch?v=V3lX3px4h-8

Tempo para ser e estar



Queria tanto falar de aonde vai o tempo quando se gasta, quando acaba seu percorrido no relógio, queria perguntar-me se os relógios de sol atrasarão na mesma medida que o sol se gasta... ou será que tenham de adianta
r? A ideia de que o sol se derreta não me agrada, pingadas alaranjadas de chuva fervendo a furar a terra, mesmo que sejam invisíveis.... Enquanto o tempo corre, mas para onde? Eu poderia responder essas perguntas se pensasse mais, mas tenho outras perguntas mais urgentes, ou mais respondíveis..,

Sobre o ser... Nada importa o que se é, importa é que concorde com o conhecer... com o saber que se é... Eu já fui flor e fui feliz, fui pedra e fui feliz, fui rio e fui feliz... corri vales de saudade... fui nuvem, e inclusive fui guerra, e fui feliz, meu problema começou quando fui humana, era bem mais fácil ser lobo, quanto que humana ando atrás do sentido do ser... Sei que não conseguirei jamais alcançar, para isso já concebi a morte... Se o ser fosse completo a morte não seria necessária, como não é para a rosa ou para a pedra... Os humanos, somos os seres mais incompletos.... Não posso dar hoje resposta a estes dilemas, então vou mergulhar em mim e falar do estar...

O deserto entra lentamente, não tem pressa, tudo acabará sendo seu... silenciosamente vai levando o grito verde sem que rapares, tenho aprendido tanto do deserto, ele começou a secar minha boca antes mesmo de eu ter nascido... nasci sabendo que minha fala se ia dissecando, eu tinha que correr de boca aberta apanhando o ar... e as palavras faladas talvez se sementariam na minha língua... E agora, agora, necessito ficar sozinha, sei ir embora em dissimulo, eu parto e tu fazes como que não me vês, inclusive me abres a porta, me convidas a sair e nem percebes que eu me parto, me parto em areias que já só o vento levará ao acaso, mas elas já não poderão exercer sua vontade, nem mesmo poderão ter vontade, parto e tu me despedes dissimulando um até breve quando na mão levas um adeus pintado... É eu, que ainda sou, já não estou... Como o sol eu, também me vou derretendo, talvez por isso gosto tanto da cor laranja... 

Concha Rousia 
Quintal d'Amaia 14 do 7 de 2012

Cativeiro

 

Cativeiro
(das canções de desespero)

Grito nos ouvidos do mundo
mas o mundo não quer me ouvir
sussurro no coração do vento
ele fará explodir meu berro-seco
no vosso entorno de falsa paz
paz assentada em polvorim
paz que vive devorando a paz
dos que moram na guerra

Grito no ouvido do mundo
mas ninguém pode me ouvir

Perdida em meu próprio eco
subo na espiral do meu grito
talvez assim consiga que vejam
como eu expulso lume pelos olhos
e então sem entender entendam
se horrorizem do que fere sua vista
mas não dá para ver não dá...

Fujam de minha amável aparência
dentro de mim há um monstro
pode mesmo parecer que não está
mas ele sempre está no mais íntimo
ele é o grande e poderoso Ulisses
cativado neste corpo de mulher

Não tratem de entender não
sua razão é altamente destrutiva
no mesmo incêndio ardemos todos
e arde o mar em que navego
meu mar de letras-explosivos
sou apenas um poeta-bomba
apenas instrumento da poesia
sou tudo que vós não veis
mas que se vísseis... talvez
desejaríeis não ter olhos...

Concha Rousia
Quintal d'Amaia 13 do 7 de 2012