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quinta-feira, 5 de maio de 2011

O rio das palavras afogadas

(meus caros amigos e amigas, neste poema, como nalgum outro o meu 'eu' poético não coincide com meu 'eu' pessoal... este aqui é um 'eu' coletivo de um povo sofrendo etnocídio...)

Se eu soubesse onde ir morrer
                                             morreria
mesmo atirando-me da ponte
                         da palavra mais alta
talvez campanário
                           ou torre
ou mesmo carvalho...
ou estrela
sem dúvida ‘estrela’ é a mais alta
se me atirasse de uma estrela
de certo morreria

Nerea insiste em que não daria chegado
em que morreria a caminho da estrela
Não seria mau
morrer subindo a uma estrela...

Talvez deva escolher outro tipo de morte
ainda que seja mais lenta e dolorosa...
              Envenenamento
beber a palavra cicuta
            podiam ser o remédio

Também já pensei em fugir
mas fugir não adianta
a nossa é uma pátria redonda
tudo se toca
tudo se vizinha de tudo

Ms antes que esse rio se desborde
esse rio da língua alheia que nós atravessa
se desborde e asolague tudo
quero estar morta

Moro na angústia de correr contra o tempo
chamar vida a vida é mesmo um eufemismo

De nada serve que grite
desde onde estou ninguém me ouve
sitiada
tem-me sitiada o assassino
oculta-me em sua negra sombra
vasta e preta capa que tudo sufoca

Por vezes pergunto-me
como será viver lá fora
na luz do dia eterno
poderia até cantar
eu sei que poderia
se cantasse agora talvez me ouvissem...
é triste pensar que ninguém se lembra de mim
todos vão construindo seus barquinhos
em forma de caixão
vão deixando que o rio os leve
a um além que não existe...

Concha Rousia

2 comentários:

  1. Concha, uma poesia destas que nos deixam afetados; contato íntimo com as lágrimas e dura de produzir sempre um sentido.
    A arte nos dá voose nos dá vivências que não possíveis noexistir; pois, são vivências parra além da fronteira.
    Belíssimo poema, me deu desejo de estar aí, eu e meu ombro, cançõese bom vinho.
    Abraços com carinho, Jorge

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  2. ...ahhhh Jorge, agradeço o carinho, a ternura, o gesto amigo que é muito bem-vindo, a realidade dura dos que vivemos em culturas sometidas tem quase tudo de negativo mas tem de positivo nos fortalecer, às vezes, para olhar de perto a dor, o medo, etc... Abraços para ti, com carinho e gratidão, Concha

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