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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Silhueta Vazia



Essa silhueta não sou eu, essa silhueta que recortas com os teus aguçados olhos, não sou eu... Sim, as formas são as minhas, não renego nem das curvas nem das ondas e nem dos ângulos que eu tenho. E reconheço a mornura da pele que as envolve, mas não sou eu lá dentro. Porque eu sei quando eu sou, eu sei quando eu estou, e quando não...

Onde estou, não sei, talvez esteja nalgum lugar desse território que me pertence, mesmo velho, roto, ou esfarrapado, que tu sempre confundes comigo. Talvez ande nalgum lugar desse corpo... Penso se será nos pés que ando, afinal se alguém sabe de andar são eles, os pés, mas não, não, hoje não ando, os meus pés levam séculos parados, como se eu fosse uma árvore... Andarei logo em meus peitos? Acho que neles poderia caber, como cabes tu quando te perdes, mas não, neles também não estou. Procuro no ventre, nas coxas, no sexo, nas axilas, nas mãos... e nada, nada de mim acho...

Onde será que eu estou? Onde foi que eu me meti? Penso e penso e penso e de repente descubro o meu presídio! Eu fui presa por mim, presa em meu próprio crânio... Sou apenas pensamento. Então devo ser eu quem me liberte. Mas antes deveria averiguar por que me encerrei, por que me encerrei...?!

Lembro que entrava para refugiar-me da fria chuva das tuas palavras quando me gritavas... Depois fui usando mais e mais esse lugar para esconder-me sem que notasses que me tinha ido. Aos poucos imagino que fui relacionando estar com aconchego, com segurança, com paz, e até com silêncio... E fui usando a cada dia mais esse refugio, mas de tanto usá-lo queimei a relva com meus passos, agora tenho um foxo no chão de tanto passear mecânico... O fojo é tão profundo, tão escuro, que quase nem eu consigo ver-me. Será por isso que demorei tanto em encontrar-me?

E agora estou aqui enquanto tu continuas a falar com essa silhueta... Pergunto-me se isto será como estar morta. E finalmente pergunto-me se será que consigo sair desta.

Concha Rousia

4 comentários:

  1. Estás aí, sim, escrever é libertar-se, nenhuma silhueta parlante, mesmo com forma de touro, pode parar a liberdade da escrita. Texto vivo é pretexto para viver e falar. Abraços.

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  2. Amei o teu texto, eu compreendo e assino por baixo, és uma pessoa de muita luz, é verdade que a escrita liberta toda a mágoa retida no coração. Tua silueta não tá vazia, és uma pessoa recheada de bons principios e valores...abraço poético de Portugal

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  3. Isabel, que bom tu apareceres por aqui :) é, nenhuma silhueta parlante pode parar a nossa libertação, obrigada pola presença...
    Abraços

    Concha

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  4. Thereza, minha amiga, alegra-me que tenhas entrado neste texto, a escrita liberta sim, nem sabemos onde estaríamos emocionalmente se não escrevêssemos... Obrigada pelo carinho, já tenho imensas saudades de ti e de Bragança, abraços grandes desde mais ao Norte

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