Janelas
Talvez seja polo efeito desse calor desproporcionado que aqui sempre me espera; eu sou dum país Atlântico e acho que o sol do Mediterrâneo afeta meus sentidos de forma a eu não saber mais o que é real ou o que simplesmente o parece...
Talvez seja por isso que os objetos me falam, numa conversa-monólogo que eu incorporo a minha experiencia, e a mim própria, num mundo que sempre me desconhece quando chego, sei que depois, à noite, esse mesmo mundo me irá levar a sonhar coisas estranhas...
Nesse dia primeiro das férias, desse verão sempre selvagem, foi a janela a primeira a falar-me, era a janela de sempre, por ela entrava a mesma paisagem que demora a mudar, aqui as árvores se eternizam para crescer. A janela, era, como já disse, a de sempre, mas a mim hoje parecia-me imensa, porque hoje, meu bem, é a primeira vez que tu me faltas nela... isso foi o que a janela me disse, o primeiro ao chegar, mesmo antes de me ter cumprimentado, mas já se sabe, janelas são assim, descaradas...
Logo que falou, a janela ficou mais descansada e permitiu-me reparar no jasmim azul, esse que eu plantei e que sempre se lembra de mim; de tarde reparando na suavidade de seu azul, vi aparecer um beija-flor, era um beija-flor diminuto, com esse seu bico longo e seu voar tão espetacular... em Valência nunca tinha visto um, e na Galiza só vim um há umas poucas semanas antes das férias, aquele estava visitando a nossa buganvília... acho que este é um novo habitante por estas terras Ibéricas, começo a pensar que o mundo talvez se ande globalizando em excesso, mesmo que a mim o beija-flor me pareceu uma bênção...
Entrei em casa e vi na televisão, essa outra janela muito menos amável, e que não me reconhece, os terríveis incêndios de Londres... Parece que os humanos andamos indignados por todo o planeta. Os projetos sociais da insatisfatória vida atual parece que vão criando suas próprias guerras, tal e como Marx anticipou, mesmo que não seja, ou sim seja, pelos mesmos motivos...
Concha Rousia
Gostei da cronica, da forma leve e lirica com a qual escreves
ResponderExcluirabraços
ja havia uma janela para o atlantico que vc descreveu bem ...essas janelas não fogem à regra .....
ResponderExcluirparabéns para sempre Concha
Obrigada Sandrio pela tua leitura, sim, leveza é minimalismo é coisa que procuro, já do lirismo não me responsabilizo, é coisa das musas... ou a inspiração inconsciente pela que me guio. Abraços, poeta.
ResponderExcluirAdilson: fico grata por tua visita e comentário, obrigada para sempre peota.
ResponderExcluirConcha
ResponderExcluirTua sensibilidade proporciona um contágio de atenção para o quotidiano que nos rodeia. Coisas aparentemente normais, mas que enchem a alma dos poetas ... e todos nós transportamos algo de poético.
Escolheste bem: Joan Manuel Serrat, mas ... por que não também um poeta/cantor galego? Bj
Concha: Esqueci-me que uso aqui Pseudónimo: Sou Carlos Jorge Mota, Porto/Portugal. Bj
ResponderExcluirCarlos: não conhecia o teu pseudónimo, mas conheço o teu rosto meu amigo, e agradeço muito essas tuas palavras, sim, eu adoro descobrir o poético do quotidiano, do simples, do que a todos nos toca; e sim, todos levamos poesia em nós, e todas as cousas são poesia tb... Quanto à música, é, para mim o Mediterrâneo pertence a Serrat, e por outro te direi que não sou capaz de vincular nada da nossa Terra, ou cultura, com o Mediterrâneo... Um Bj
ResponderExcluirO conceito de mediterraneidade, na minha opinião, é muito mais abrangente. Nós, aqui neste cantinho, procuramos, inclusive, preservar a dieta mediterrânica, em contraponto com o denominado "fast food", pela excelente qualidade nutricional daquela face à péssima cultura alimentar deste. O nosso Algarve, sem se situar no Mar Mediterrâneo, sofre influência climática de lá, apesar de estar a poente de Gibraltar.E não nos podemos esquecer da influência árabe, grega, fenícia ... Não foi só a Celta, embora seja a esta a que mais me orgulho de pertencer. Carlos Jorge Mota
ResponderExcluirSim, Carlos, é verdade, mas eu sou dos que foge da dieta Mediterrânea e uma defensora da dieta Atlântica, acho que nós (pelo menos a Galiza) somos um bocadinho de Atlântico tentando esquecer isso e tentando encaixar no ser mediterrâneo... Consideramo-nos 8não eu, nem muitos de nós, mas muitos outros sim, e em geral sim, uns desadaptados por mor de não ser o que tentamos ser: Mediterrâneos, fracassados por isso, Atlânticos fracassados num mundo a cultura Atlântica trunfa no mundo ocidental... somos uns bichos raros, sempre o fomos, e talvez tenhamos que aceitar sempre o ser... Entendo isso do Sul, do belo Algarve, sim, não conheço mas quero conhecer, um abraço.
ResponderExcluirOlá Concha,
ResponderExcluirHá janelas e janelas...
Beijos de luz.
...é Luz, há janelas e janelas...
ResponderExcluirAbraços para ti
Concha
E nesta janela,
ResponderExcluirespecífica janela,
há o encanto
de uma mensagem cifrada
em luz e sombra
na graça do observador:
pois se do lado de cá
há tanta claridade
e do lado de lá
pouca sombra
o que se conclui?
Sim, há esperança...
Per Galiza,
Hosamis.
Se conclui, Hosamis, que tu és sábia, e que entendes, sem ver e mesmo sem conhecer o meu mundo :) sim, há esperança...
ResponderExcluirAbraços
P.S.: desde hoje vou ficar com pouco acesso a rede, vou deixar o mundo descansar de mim. Concha