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sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Crónicas do Mediterrâneo: II


 Uma flor a desafiar o tempo


Ando habitada de brasileirismos, levo vivos dentro os aromas do mato que me vive do outro lado do Atlântico e eu aqui, longe da Galiza, no Mediterrâneo, que ontem soube por uma amiga que vive a olhar o Atlântico, navegando soidades e saudades que o mar bravo entende e cura... aprendi dela, e de seu saber de bruxa costeira, que o Mediterrâneo é apenas um nome, um nome para uma partição das águas que se metem a abraçar a península Ibérica pelo leste, mas esse mar é apenas um braço do Atlântico, eu entendi e aceitei bem isso, como sei que outro de seus braços chega até o ventre de algumas montanhas, assim é o nosso mar, bravo, poderoso...

O Mediterrâneo tem flores frondosas que me fazem ainda mais ter saudades do Brasil, que insiste em me povoar, ou será que insisto eu? Isso nem me paro a elucidar, amo o Brasil, como amo a Galiza, mesmo que seja de maneira diferente, com urgência diferente, com necessidade diferente, amo o Brasil como quem ama um Deus, ou como quem ama o sonho de uma pátria, como quem aceita interpretar Ulisses que voltará a Terra à que sabe que jamais poderá regressar...

E agora o motivo da crónica, sim, as flores. Ontem conheci uma flor da que não sei o nome, porque sua dona, minha cunhada japonesa, anda estes dias viajando pola Escócia... A família cuida da exótica plantinha, que tem por costume produzir uma flor nova cada dia, uma flor que parece de papel e que dura apenas um dia, a flor nasce com o sol novo desse dia e morre com o ocaso desse dia, depois ela deita a flor no chão para seu dormir eterno, eu maravilhada desse hábito da plantinha, passei as horas a contemplá-la, até consegui chamar a atenção de meus familiares, que tiraram fotos comigo a falar com a flor... 

Eu apanhei uma das flores deitadas fora pela planta no dia anterior e guardei em meu livrinho de viagens, uma pétala... como uma lembrança de um momento vivido com a planta e sua flor... Chegou a noite, o sol foi-se, e todos, depois de um interessantíssimo programa de televisão sobre as impressionantes bodas ciganas na Irlanda, fomos à cama, a flor ficara pronta para ser lançada ao chão a dormir seu eterno sono... 
A noite pareceu-me longa, sempre mo semelha aqui no Mediterrâneo, as noites são passeios por um inconsciente desorientado, com sonhos que sem chegarem a ser pesadelos são desassossegantes, neles aparecem cães que me mordem nas mãos, sempre nas mãos, ou com galinhas que tem centos de pintinhos que fogem... Recebo a madrugada como um grande alívio... Hoje acordei, vi que a pétala tinha deixado em meu livro as marcas da forma de uma vieira, ou concha dos peregrinos, o que me pareceu bem misterioso, mas não dei maior atenção... 

Saí fora, não posso chamar de quintal a esse espaço ermo, meio desértico, roubado de ervas e humidades que parece que ressecassem o olhar... chamarei de ‘parcela’ que é como aqui se chama. O primeiro que vi foi a planta com a que o dia anterior andara eu a conversar... Surpreendeu-me ver que tinha duas flores... 



Mas o que mais me surpreendeu foi descobrir que uma dessas flores era a flor do dia anterior, era a flor que tinha que ter sido deitada fora, mas que por um mistério que ninguém se atreve a analisar a planta decidiu não deixar morrer, rompendo a sua tradição, vencendo a sua própria natureza, e ensinando-me que nem só nós, humanos arrogantes, somos os únicos a tentar e lograr impossíveis... Poderia ficar desconcertada pelo que se passou mas decidi simplesmente partilhar o que achei um pressente que a natureza me fez, demonstrando que me ouviu, que me escutou, e que talvez quer que eu a escute a ela... 

Concha Rousia
Vilamarxant 10 de agosto de 2011 
 

8 comentários:

  1. Hibiscus ... são os hibiscus ... e são das mais variadas cores ...por aqui são usados para se fazer cercas vivas ...como as minhas em frente ao mar de Angra ...quando por lá passei... abçs

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  2. Hibiscus, obrigada Adilson, estava desejando saber e ninguém lembrava o nome; acho que desejaria ter uma de cor azul, é uma flor que me encantou, e a planta também, abraços.

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  3. Sim, hibiscos! Aqui no quintal de casa temos, e lá na frente, na calçada temos outro pé que está em árvore de uns 2 metros de altura. Essa, da calçada, impressiona, pois no mesmo pé florescem flores de duas cores: vermelha e salmon... linda, linda. São delicadas e fáceis de viver, planta-se um galhinho e pega. Concha, você precisa pedir um galhinho aí para a sua cunhada e plantar na Galiza!! (rsr).

    Linda crônica!

    Carinho,

    Hosamis.

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  4. Hosamis, talvez seja fácil de viver para a plantinha no Brasil, mas na Galiza o clima pode ser duro, mas vou tentar plantar uma, acho que para além de querer uma azul, eu sempre quero azul, quereria outra cor salmão.

    Abraços com carinho Hosamis

    Concha

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  5. Olá Concha,

    Como estás? De férias, como me disseste.
    Eu já regressei e penso postar 2ª feira. Aparece.
    Agradeço os teus comentários e desejos de boas férias.
    Desejo, tb, que as tuas estejsm a decorrer, excelentemente.
    Quanto à florzinha, ela quis viver e romper com a tradição.
    Escreves muito bem, Concha, com naturalidade e fluidez.

    Beijos de luz.

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  6. Sandrio,meu amigo, agradeço sempre a tua olhada em meus textos, abraços, Concha

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  7. Que tal foram as férias Luz? Eu morro de calor, sou de um pais de inverno e este sol Mediterrâneo não me reconhece e não me trata bem, espero que tu voltasses carregada de energia e poesia, irei lá te ler... Sim naturalidade e simplicidade minimalista é meu lema na escrita, obrigada pelo elogio, comecei escrevendo por necessidade, rs e agora escrevo tb por necessidade rs (mas com maior prazer) beijos para ti Luz, Concha

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