Tudo comigo
Ontem o dia concedeu-me horas livres, sem nuvens nem taxas, e decidi sair a passear por fora da pele dos meus olhos; havia tanto tempo que não fazia isso que até me custou encontrar a porta; pode parecer ironia tratando-se dos olhos, a janela mais mais universal e luminosa para o mundo de fora, e não só de fora, porque quando olhamos e vemos a flor vemos também o sentimento que não podíamos ver até que nos tocou a beleza da flor, a dureza da pedra, o encanto do rio que canta e depois, à noite, quando ninguém o espreita, aproveitando que está deitando em seu leito, ele dorme... e a água fica caladinha...
Custou-me sair, já disse, até chegar à entrada do percurso da luz que ilumina fora tive dificuldades... Sei que tudo é causado por eu ter os olhos demasiado voltados para dentro, para mim mesma, costas viradas, tive que me revolver para enxergar a diminuta luz que anunciava a boca do túnel que atravessa o olho, para ir ter ao mundo colorido e mágico de fora... Agora causa-me arrepio imaginar como um olho se vê a si mesmo, mas não vou pensar nisso... Os espelhos é um tema que me fascina tanto que se entro por aí sei que não saio... Ainda assim, sair demora... que altos ficam os meus olhos, mesmo sendo eu baixinha, nunca reparara o longe que estão do chão... Aninhei-me para diminuir o vertigem, é tudo tão relativo...
Saí ao quintal, as rosas quase se assustaram ao ver-me, ao refletirem-se nos meus olhos abertos, já até deviam imaginar que eu era uma dessas pedras que mudam de lugar e pouco mais... Respirei seu perfume com os olhos abertos, como todo ato de amor puro deve ser feito... Aroma e cor se misturando com o canto dos pássaros, uma trança que atou meu ser à Terra do Quintal. Descalcei-me, senti a frialdade da relva molhada... e chorei, como se lavasse roupa usada, lavava as emoções que estavam abolorecidas nos arquivos da desmemória por falta de ventilação...
Então me senti tão acompanhada que até pensei em ti... Como era possível não sentir falta de ninguém, nem sequer de ti, meu bem? E foi daí que compreendi: tudo que faz parte de mim, como tu fazes, como faz o mar, como faz a sangrada lagoa de Antela, ou o primeiro beijo... Tudo estava comigo, tudo comigo...
Concha Rousia
Quintal d'Amaia 2 do 7 de 2012
Ontem o dia concedeu-me horas livres, sem nuvens nem taxas, e decidi sair a passear por fora da pele dos meus olhos; havia tanto tempo que não fazia isso que até me custou encontrar a porta; pode parecer ironia tratando-se dos olhos, a janela mais mais universal e luminosa para o mundo de fora, e não só de fora, porque quando olhamos e vemos a flor vemos também o sentimento que não podíamos ver até que nos tocou a beleza da flor, a dureza da pedra, o encanto do rio que canta e depois, à noite, quando ninguém o espreita, aproveitando que está deitando em seu leito, ele dorme... e a água fica caladinha...
Custou-me sair, já disse, até chegar à entrada do percurso da luz que ilumina fora tive dificuldades... Sei que tudo é causado por eu ter os olhos demasiado voltados para dentro, para mim mesma, costas viradas, tive que me revolver para enxergar a diminuta luz que anunciava a boca do túnel que atravessa o olho, para ir ter ao mundo colorido e mágico de fora... Agora causa-me arrepio imaginar como um olho se vê a si mesmo, mas não vou pensar nisso... Os espelhos é um tema que me fascina tanto que se entro por aí sei que não saio... Ainda assim, sair demora... que altos ficam os meus olhos, mesmo sendo eu baixinha, nunca reparara o longe que estão do chão... Aninhei-me para diminuir o vertigem, é tudo tão relativo...
Saí ao quintal, as rosas quase se assustaram ao ver-me, ao refletirem-se nos meus olhos abertos, já até deviam imaginar que eu era uma dessas pedras que mudam de lugar e pouco mais... Respirei seu perfume com os olhos abertos, como todo ato de amor puro deve ser feito... Aroma e cor se misturando com o canto dos pássaros, uma trança que atou meu ser à Terra do Quintal. Descalcei-me, senti a frialdade da relva molhada... e chorei, como se lavasse roupa usada, lavava as emoções que estavam abolorecidas nos arquivos da desmemória por falta de ventilação...
Então me senti tão acompanhada que até pensei em ti... Como era possível não sentir falta de ninguém, nem sequer de ti, meu bem? E foi daí que compreendi: tudo que faz parte de mim, como tu fazes, como faz o mar, como faz a sangrada lagoa de Antela, ou o primeiro beijo... Tudo estava comigo, tudo comigo...
Concha Rousia
Quintal d'Amaia 2 do 7 de 2012
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